Jornal Folha de São Paulo.
São Paulo, quarta-feira, 21 de maio de 2008 - Os museus são ferramentas para todas as classes sociais, instrumentos de mudança social e desenvolvimento
"Os conservadores são pessimistas quanto ao futuro e otimistas quanto ao passado" (Lewis Mumford)
por JOSÉ DO NASCIMENTO JÚNIOR
NUNCA ANTES neste país os museus foram tão discutidos. O espaço que o tema dos museus vem ocupando está refletindo positivamente para que as políticas culturais se aproximem mais do universo museal. Atualmente, existem cerca de 60 mil museus em todo o mundo, dos quais 90% criados após a Segunda Guerra Mundial. Fazer uma reflexão sobre o papel dessas instituições é de fundamental importância e deve ser uma preocupação permanente. Para que a sociedade se aproprie de suas múltiplas possibilidades, os museus aprofundam suas ações de comunicação, educação e pesquisa, que, por sua vez, possibilitam o desenvolvimento de novas ações de caráter inclusivo. Isso torna a instituição museu uma das mais complexas criadas pelo ser humano, com diversas expressões em mais de uma centena de países. No Brasil, são cerca de 3.000 museus, que representam 5% dos museus do mundo. Por essa razão, tal como em outros países, a realidade museológica brasileira tem que ser pensada e repensada a todo momento. Nossa diversidade museal tem relação direta com o tema do Ano Ibero-Americano de Museus, que comemoramos em 2008. O tema, que foi também adotado para as comemorações do Dia Internacional dos Museus, 18 de maio, é "Museus como agentes de mudança social e desenvolvimento". Olhando para esse cenário após cinco anos do lançamento da Política Nacional de Museus pelo ministro Gilberto Gil, podemos ver os resultados já alcançados: a criação do Sistema Brasileiro de Museus; a Semana de Museus, que vai para a sexta edição, com mais de 1.500 eventos em todo o país; o aumento da visitação, de 14 milhões, em 2003, para 21 milhões, em 2007; a ampliação dos investimentos, de R$ 24 milhões para R$ 140 milhões; a capacitação de mais 20 mil profissionais nesses cinco anos; e a ampliação da oferta de cursos de graduação em museologia, de dois para oito, em diversas regiões brasileiras. A Política Nacional de Museus tem o reconhecimento internacional, servindo até mesmo de modelo para outros países. Esses números mostram que o Estado deve assumir a coordenação de suas políticas públicas e ser gestor, indutor e regulador, diferentemente da receita neoliberal do Estado mínimo. O Congresso nunca atuou tanto em relação aos museus como nos últimos cinco anos, a exemplo da proposta de criação do Estatuto de Museus e dos mais de dez projetos de lei que tramitam na Câmara e no Senado. A Política Nacional de Museus tem em sua gênese um caráter democrático e participativo, rompendo com a lógica de barões e vassalos, ampliando os interlocutores, e continua recebendo diversas contribuições que chegam de toda a parte para aperfeiçoar esse processo colocado em marcha ao longo desses anos. É claro que ainda falta muito a fazer nessa trajetória, pois apenas 20% dos municípios brasileiros têm museus. Diferentemente da China, que decidiu que até 2010 criaria 5.000 museus novos, temos que sensibilizar cada vez mais a sociedade para a preservação da memória e para pensar os museus como ferramentas para todas as classes sociais, como instrumentos de mudança social e desenvolvimento. Os museus são espaços de poder e muitos deles foram criados para simbolizar isso. Temos exemplos como o MoMa, de Nova York, que serviu à Guerra Fria, e até mesmo o Museu Histórico Nacional, no Rio de Janeiro, que foi criado pelo Estado Novo para produzir uma idéia de nação. Nessa nova fase, os museus brasileiros trabalham na institucionalização da política museológica, com a criação do Ibram (Instituto Brasileiro de Museus). Essa proposta integra o programa de governo do presidente Lula e é um passo fundamental para dar continuidade às conquistas da Política Nacional de Museus. É uma inovação em relação ao atual modelo de gestão do patrimônio cultural, inovação que já ocorreu em outros países. Essas ações são uma construção da imaginação museal brasileira, que tem caminhado em busca de garantir um futuro perene para o campo museal brasileiro. Esse futuro se constrói hoje.
JOSÉ DO NASCIMENTO JÚNIOR, 41, antropólogo, mestre em antropologia da política, é diretor de Museus e Centros Culturais do Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), do Ministério da Cultura.
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