quarta-feira, março 08, 2006

Se lá é assim, imaginem aqui, no sertão, quem leva museu a sério?

No dia 14 de janeiro de 2005, o jornal Diário da Manhã, remodelou, interpretou, resumiu e finalmente, publicou uma" versão" de um artigo de opinião de minha autoria sobre o Museu de Arte de Goiânia. http://www.dm.com.br/impresso.php?id=68839&edicao=6280

"Museu de arte de Goiânia?
O Museu de Artes de Goiânia, MAG, fundado em 1969, possui alguns problemas evidentes. O MAG não é tratado pelo Poder Público como uma instituição dedicada à preservação do patrimônio cultural. Pois, instalado em um prédio adaptado, divide a outra metade com as ruínas do Centro Livre de Artes. O telhado inadequado e mal projetado coloca em risco os equipamentos e mobiliários, além do próprio acervo. As soluções precisam ser urgentes, pois é impensável nos dias de hoje um Museu de Arte que não esteja à altura da riqueza do patrimônio cultural da cidade."
por Deolinda Conceição Taveira Moreira, Conservadora Restauradora de Bens Culturais, Vila Nova, Goiânia-GO,via e-mail

Ao ler a entrevista de Paulo Herkenhoff, ex-diretor do Museu Nacional de Belas Artes, concedida à jornalista Cleusa Maria e publicada no JB do dia 08 de março de 2005, só nos resta mesmo é pensar que se lá é assim, imaginem aqui, no sertão. Quem leva museu a sério?

Em Goiânia, no Museu de Arte de Goiânia, além do telhado continuar a fazer água por todos os lados, dos criadouros de mosquito da dengue e de baratas, é também o local escolhido pela Secretaria de Cultura para instalar não apenas os apaniguados políticos, mas também os "apaniguados fantasmas", até a "diretora" é invisivel. E enquanto isso ... no Rio de Janeiro ...

Na linha de tiro.
Diante da atual onda de roubos a acervos públicos, Paulo Herkenhoffdiz que a falta de segurança nos museus no Rio é gravíssima.
por Cleusa Maria
O quadro que ele pinta do atual momento cultural não é nada animador para uma cidade que acaba de se chocar duplamente no setor. Primeiro, com o roubo das obras de Matisse, Picasso, Monet e Dalí, levadas do Museu Chácara do Céu (da rede federal), em Santa Teresa, na sexta-feira de carnaval, e até ontem não recuperadas. E dez dias após, na segunda-feira passada, com o saque de dez peças valiosas do Museu da Cidade (da Prefeitura do Rio), na Gávea. Ex-diretor do maior e mais importante museu público federal do Brasil, o Nacional de Belas Artes (MNBA), no Rio, e também ex-curador assistente do Departamento de Pintura e Escultura do MoMA, em Nova York, Paulo Herkenhoff sinaliza o perigo:
– O que se tem de entender é que a questão dos museus federais no Rio é urgentíssima e gravíssima – alerta, por telefone, de Nova York, onde se encontra em tratamento de saúde.

Ele se refere à situação do MNBA – guardião da mais valiosa coleção de arte brasileira, integrada por 17 mil peças, do período colonial ao contemporâneo – para dar a medida dos riscos que, na sua opinião, correm os acervos públicos da nação. E que continuarão correndo, casos essas instituições não sejam levadas a sério pelas autoridades e pela sociedade, a quem cabe cobrar dos responsáveis uma política de segurança eficiente.

– Um dos motivos, entre os vários, que me fizeram deixar a direção do Belas Artes (em janeiro passado) foi que inverteram a pauta de obras à minha revelia. Fazem a fachada, mas esquecem a estrutura que vai garantir o esquema de segurança. E este problema não está no nível do ministério, mas do Departamento de Museus. Não vou subir ao palanque da campanha eleitoral – declara Herkenhoff.

A rede pública federal no Rio é integrada pelo Museu Histórico Nacional, Museu da República, Museu Nacional de Belas Artes, os Museus Castro Maya e o Museu Villa-Lobos. O diretor do Departamento de Museus e Centros Culturais do Iphan/MinC, José Nascimento Jr., diz preferir não alimentar debates com Herkenhoff. E afirma que a posição da instituição diante da polêmica já foi divulgada em carta oficial do MinC (leia nesta página). Paulo Herkenhoff, porém, não limita sua denúncia à atual política nacional de museus:
– A irresponsabilidade começou com o ministro Weffort (no segundo mandato de Fernando Henrique entre 1999 e 2002), que transformou a Lei Rouanet numa orgia de projetos, eventos e coisas caríssimas. Criou uma cortina de fumaça fantástica e legitimou um processo, através do qual os museus federais no Rio foram literalmente abandonados ao caos. A irresponsabilidade também não é só do Ministério da Cultura, é do Ministério do Planejamento e da política de “Estado mínimo”, que reduziu o corpo de funcionários, de modo que não há diferença entre as políticas de Collor, FHC e Lula no tocante à estrutura dos museus federais.

Ele poupa, contudo, o ministro Gilberto Gil, por seu “efetivo engajamento pelo aumento das verbas”. Desta forma, o MNBA conseguiu criar uma brigada contra incêndio e dobrar o número de vigilantes.

– No entanto, foi inaceitável protelar as obras de segurança contra roubo, incêndio e intrusão, em favor da restauração das fachadas, que são obras para ano eleitoral. Nossos museus federais não estão equipados. No caso da segurança é preciso, claramente, ser repensado um sistema integrado, onde haja pessoal treinado, uma política cotidiana de segurança e equipamentos funcionando. Ou o ministro do Planejamento entende que o patrimônio cultural federal precisa de mais funcionários e mais recursos ou perderemos estes acervos.

Segundo Herkenhoff, tudo começa com a situação do país, que enfrenta o tráfico de drogas e a violência, com roubos de instrumentos científicos em universidades e hospitais. É neste sentido também que se dirigem as preocupações da museóloga Vera Tostes. Há 11 anos diretora do Museu Histórico Nacional, na Praça Marechal Câmara – que integra a rede federal e guarda 259 mil peças, da arqueologia aos dias atuais –, Vera teme o efeito dominó.

– Estou preocupada com a reação em cadeia que os roubos podem provocar. O que é lamentável, pois não é um comportamento cultural do nosso povo. Pode até não aparentar, mas o brasileiro tem respeito pelo patrimônio histórico, que é uma herança de todos e deles também (refere-se aos assaltantes).

Paulo Herkenhoff diz que indignar-se, apenas, não leva a nada:
– A indignação da sociedade passa rápido, dura até o próximo roubo. O que as pessoas que combateram tanto a vinda do Guggenheim para a cidade, sob o argumento de que era mais importante investir nos nossos museus, fizeram para que estes investimentos se concretizassem?
Publicado no Jornal do Brasil de 08 de março de 2006 - http://jbonline.terra.com.br/


Novo padrão de saques

Ainda se espelhando no Museu Nacional de Belas Artes, que dirigiu por três anos, como exemplo dos desmandos que, segundo ele, envolvem os museus federais, Paulo Herkenhoff pergunta:
- Como pode ser nomeada para dirigir o Belas Artes uma diretora saída do Museu de Arte Moderna que, sob sua direção, teve o acervo destruído por incêndio (1978)? A mesma diretora (refere-se a Heloísa Lustosa) que, 12 anos depois, iria deixar o museu à beira de um incêndio, de acordo com laudo dos técnicos da USP. É sinal de que o Rio de Janeiro não está levando seus museus a sério. O Rio tem de refletir sobre isso.

Para o, hoje, curador independente, o problema não se limita a investimentos, mas também à museologia praticada no Brasil, ''muitas vezes, desatualizada''. Herkenhoff cita como parâmetro de contemporaneidade o Mori Art Museum, de Tóquio, localizado no 24º andar de um prédio e protegido pelo fogo retardante - uso de materiais tecnicamente fabricados para retardar o alastramento das chamas.

- Este mesmo sistema foi sugerido pelo arquiteto Paulo Mendes da Rocha para o novo pavilhão do MNBA, que não chegou a ser concluído. É preciso atualizar nossa museologia. Ou se é um museu do século 20; ou do século 19. Não tem escolha.

A museóloga Vera Tostes, ao contrário, afirma que os grandes museus nacionais (como é o caso do MHN e do MNBA) ligados ao MinC têm sistema de segurança adequado e compatível com as exigências internacionais. Ou não receberiam as exposições que já receberam de fora do país.
- Ambos os museus foram colocados como prioridades do ministro Gilberto Gil, que teriam um forte investimento. Dentro deste forte investimento, cada dirigente criou seus projetos. O MHN já recebeu até agora R$ 7 milhões. Priorizamos a restauração da edificação histórica e equipamentos tecnológicos que dessem maior segurança documental ao acervo. Junto a essas medidas sempre estiveram incorporados projetos de ampliação e modernização da segurança do museu - assinala Vera.

A diretora do MHN conta que, há oito anos, o museu dispõe de circuito interno de câmeras, além do sistema detector de fumaça e instrumento de intrusão de pessoas com sensores que disparam alarmes sempre que alguém toca nas vitrines ou janelas. Além de 30 postos de vigilância cobertos por funcionários da própria casa e outros terceirizados.
- O que eu acho que está espantando a população é que os roubos se deram em assaltos à mão armada. É um novo momento e é preciso pensar e se preparar para isso. Pois os equipamentos atuais servem para impedir furtos e identificar os responsáveis por eles. Assaltos como os de agora acontecem em qualquer lugar do mundo - prossegue Vera.

Para Paulo Herkenhoff, o Brasil vive uma situação bem mais complicada:
- Este é um país onde o Conselho Federal de Museologia é dirigido por uma pessoa que vende seguros - afirma o curador, referindo-se à museóloga Telma Lasmar, ex-diretora da Divisão de Administração do Museu de Arte Contemporânea de Niterói.

Mesmo ressaltando que o acervo do MHN, por ter grande valor histórico e praticamente nenhum valor comercial, estaria mais protegido de saques, Vera Tostes vê a necessidade de se estudar um novo sistema em conjunto com a Polícia Federal, Estadual e os diretores de museus.
Ela lembra que, nos últimos seis anos, o Iphan teve a preocupação de se aproximar da Interpol e da Polícia Federal, no sentido de adotar critérios ''mais internacionais'' de proteção ao seu patrimônio.
- Quem pensa que o Brasil está isolado da política de segurança do resto do mundo desconhece esta realidade - assegura Vera.

A quem pergunta por que um diretor de museu deixaria o cargo justamente no momento em que, já tendo projetos a executar, recebe verbas de várias fontes no valor de R$ 10 milhões, Herkenhoff responde:
- Não se deu prioridade às obras de estrutura museológica e não quero esta responsabilidade para mim. No meu último dia útil no MNBA, caiu uma daquelas chuvas fortes de verão. Fiquei até as 11h30 da noite com minha pequena equipe, trocando quadros de lugar, tentando fugir das goteiras.



A propósito da matéria intitulada De roupa nova, publicada no dia 5 de fevereiro de 2006 no Correio Braziliense, o Ministério da Cultura vem a público esclarecer que estranha alguns dos motivos alegados publicamente pelo Sr. Paulo Herkenhoff, ex-diretor do MNBA, para o seu pedido de demissão. Em carta endereçada ao ministro da Cultura, assim como em conversa telefônica com dirigentes do MinC desde setembro de 2005, o ex-diretor afirmou que desejava sair por motivo de saúde e para tratar de assuntos particulares.
Diferentemente do que alegou o ex-diretor, não parece ter havido ''vazamento de informações'' sobre o projeto do arquiteto Paulo Mendes da Rocha encomendado pela antiga direção do MNBA, até porque não há razão para que um projeto arquitetônico encomendado por órgão público seja tratado como sigiloso.
Foi realizado no próprio MNBA, ainda em 2003, um evento sobre a reformulação arquitetônica do prédio da instituição, que viria a ser elaborada pelo arquiteto Paulo Mendes da Rocha. Esta cerimônia foi amplamente divulgada pela imprensa. O edifício-sede do Museu Nacional de Belas Artes é um bem cultural tombado em nível federal e qualquer intervenção ali pretendida, como seria o caso da construção de um anexo, deve ser submetida à análise técnica prévia do Iphan, assim como ser discutida com a equipe técnica do museu e com a sociedade.
O Museu Nacional de Belas Artes, desde o início da gestão do Sr. Herkenhoff, recebeu todo o apoio do Ministério da Cultura e do Departamento de Museus e Centros Culturais do Iphan. Um apoio que não foi retórico, mas que se materializou em expressiva dotação orçamentária e auxílio técnico e político.
Ao indicar a museóloga Mônica Xexéo para a direção do MNBA, o MinC pretende retomar o desenvolvimento de projetos museológicos na instituição, valorizar seu acervo e equipe e devolver o MNBA ao público. O MinC reafirma seu compromisso com a Política Nacional de Museus e o apoio ao Departamento de Museus e Centros Culturais.
A autonomia dos museus vinculados ao MinC está garantida. No entanto, é fundamental que haja um compromisso com a gestão responsável, com o respeito aos órgãos competentes e com a ressignificação dos museus, tema que se expressa no projeto de criação do Instituto Brasileiro de Museus.

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