sábado, novembro 22, 2008

MP pede demolição de obra que obstrui prédio histórico

[ 21 11 2008 ]
PATRIMÔNIO – Promotora pede na Justiça que prefeitura derrube parte do terminal urbano construído em 98 e que impede visualização da antiga estação ferroviária
por Fernanda Morais para o Jornal do Estado de Goiás

O Ministério Público (MP) de Goiás, através da promotora Sandra Mara Garbelini, protocolou nesta sexta-feira (21) na Justiça, ação civil pública com pedido de tutela antecipada contra a prefeitura de Anápolis e a empresa TCA, com objetivo de preservar a antiga estação ferroviária localizada no Terminal Urbano de Passageiros.
O MP pede que a Justiça determine que a prefeitura providencie a demolição e destruição de todos as construções relativas ao terminal 2, ou "novo terminal", que hoje obstrui a estação ferroviária. O órgão se refere a parte que foi construída em 1998. Além disso, a prefeitura teria que promover a revitalização e recuperação do prédio tombado pelo patrimônio histórico.
A promotora Sandra Mara Garbelini pede também que no processo licitatório já iniciado para o transporte coletivo, conste no edital que a empresa vencedora não poderá utilizar a parte do terminal construída em 1998, "em razão de impedir a visibilidade do bem tombado". "E que os estudos da licitação contemplem o deslocamento da frota de ônibus do terminal 2 para outra localidade".
Entre os argumentos para o pedido feito pelo MP, a promotora Sandra Mara utilizou laudos técnicos que comprovam a necessidade de preservação do prédio e defende mudanças no Terminal Urbano.
No dia 14 de novembro a 14ª Superintendência Regional do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) enviou ofício ao MP onde relata vistoria feita em 2007, onde foi constatado que a antiga estação encontra-se "obstruída pela presença de edificações construídas em suas imediações".
"A visibilidade do bem, aspecto determinante para a fruição dos valores nele intrínsecos, está seriamente comprometida, sendo de fato o Terminal Rodoviário Urbano de Anápolis responsável pela maior parte da agressão às visuais do bem em questão", diz o documento, assinado por Paulo Henrique Farsette, chefe da divisão técnica da 14ª Regional do Iphan.
No dia 21 de outubro a Agência Goiana de Cultura (Agepel) também entregou seu laudo técnico sobre a estação ferroviária. O documento completo, com fotos e reprodução de trechos da história do prédio histórico, conclui que o Terminal Urbano impede o acesso visual da população à estação. "Desta forma, os valores ali presentes vão se tornando cada vez menos reconhecidos por aquela sociedade, que vai se distanciando deste bem", diz o relatório da Agepel.
A Agepel destaca ainda que o intuito é permitir a preservação da antiga estação ferroviária, que guarda uma importância arquitetônica ou histórica, acima de tudo cultural. "E neste aspecto, o terminal não condiz com esse conceito de preservação de imagem cultural, pois ele desestrutura e afasta uma imagem, um valor de uma época e, assim, impede a contemplação daquela sociedade que considera aquele bem", informa o laudo técnico.
Os técnicos da Agepel informam que percebem uma incompatibilidade de usos entre a estação ferroviária enquanto bem de identidade cultural da cidade e o Terminal Urbano. "Sendo preocupante em razão dos efeitos que este terminal possa produzir ao longo do tempo, retirando o reconhecimento da população do registro histórica da estação", finaliza.
Sessão
Sessão especial realizada na segunda-feira (17), na Câmara Municipal, debateu a atual situação da estação ferroviária prefeito José Fernandes Valente, patrimônio histórico de Anápolis e que hoje está ilhada pelo Terminal Urbano de Passageiros. Vereadores, membros do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural e Histórico e representantes da empresa TCA estiveram na sessão proposta pela petista Dinamélia Ribeiro.
Em sua fala inicial, Dinamélia relembrou a história da antiga estação ferroviária, tombada como patrimônio histórico e cultural na gestão do prefeito Anapolino de Faria, em 1991. A vereadora enfatizou que o local é o maior símbolo do desenvolvimento econômico do município e atualmente está ilhado dentro do terminal urbano.
Dinamélia também frisou que o momento não era para julgar nem condenar o terminal que atende a população da cidade, mas sim de mostrar posicionamentos de ambos os lados e auxiliar em possíveis buscas de soluções. "O prédio é patrimônio cultural e tem que ser conservado, protegido. Eu acredito que a empresa envolvida não dificultaria essa preservação. A TCA é anapolina", disse.
O presidente do Conselho Municipal do Patrimônio Cultural e Histórico, Jairo Alves Leite, destacou que o prédio está protegido por lei e o principal interesse daqueles que defendem a revitalização do espaço é fazer com que a população tenha acesso à história do município. "Muitos acontecimentos econômicos importantes passaram pelos trilhos do trem daquela estação hoje escondida", afirmou.
Além disso, Jairo Alves Leite alertou sobre os problemas que a localização do terminal urbano provoca na região central da cidade. As ruas são estreitas para acomodar os carros e há uma grande quantidade de ônibus que transitam durante todo o dia e boa parte da noite pela cidade. "Os ônibus são importantes para a cidade, mas existe a necessidade de fazer uma descentralização do transporte coletivo", comentou.
Com o passar do tempo e com o desenvolvimento da cidade, o presidente acredita que a concentração de ônibus no centro se tornaria inviável. O ideal, de acordo com ele, seria construir estações coletivas urbanas na cidade. "Não quero de maneira alguma confrontar com a empresa, apenas penso em resolver a situação da melhor maneira possível", disse.
TCA
"Do jeito que as coisas são ditas, dá a impressão de que a TCA invadiu aquela parte para construção do terminal, e não é bem assim". Essas foram as primeiras palavras do diretor-presidente da empresa de ônibus da cidade, Lacy Martins. Ele acrescentou ainda que no momento que foi construído o terminal urbano, a empresa tinha autorização da prefeitura e que na época não existia a lei que tombou a estação ferroviária como patrimônio cultural de Anápolis.
O diretor da TCA defendeu que a retirada do terminal do centro da cidade não resolveria o problema definitivamente. Para ele é necessário pensar nas pessoas que utilizam os ônibus, no comércio da região e nos próprios lojistas que atuam dentro do terminal. Lacy Martins disse que já foi realizada audiência com o Ministério Público, mas nenhum acordo ficou firmado. "Existem as leis e nós da TCA não discutimos isso, apenas cumprimos o que é determinado pela Justiça. Estamos esperando uma definição", afirmou.
Lacy Martins também atacou outros pontos da cidade que são considerados como patrimônio histórico e cultural. Segundo ele a TCA foi responsável por promover por duas vezes a restauração da estação ferroviária que estava completamente abandonada antes da construção do terminal. "Temos também os investimentos, são milhões de reais que aplicamos na qualidade do transporte urbano", defendeu.
Além desses argumentos, o diretor-presidente não acredita que a mudança para o terminal rodoviário Josias Moreira Braga seria a melhor solução, tendo em vista que o local não comportaria os comerciantes, os ônibus e a média de 70 mil pessoas que passam pelo terminal diariamente. "Não vou discutir leis, nem preservação, mas temos que ver todos os pontos dessa mudança", observou.
Os comerciantes do espaço em discussão foram representados por Deusvando Luiz Rosa, que defendeu que o terminal deve continuar no centro da cidade. Segundo ele, são mais de 70 famílias que trabalham no espaço e que necessitam do movimento das pessoas que utilizam o transporte coletivo. Na sessão os comerciantes levaram uma faixa defendendo o monopólio da TCA em Anápolis.
Símbolo do crescimento
Anápolis possui apenas nove monumentos considerados, por Lei, patrimônio histórico. Dentre eles a Estação Ferroviária Central, que foi tombada pela Lei 1824, no ano de 1991, juntamente com a Casa de Zeca Batista, hoje Museu Histórico; o prédio da atual escola de Artes, antiga Cadeia, e o atual Palácio da Cultura, que já foi a Prefeitura Municipal e Fórum da cidade. De todos estes patrimônios históricos certamente a Estação é a que se encontra em pior estado de conservação.
Em estilo Art Déco, ela foi inaugura em 1935 e é tida pelos historiadores como o maior símbolo do desenvolvimento econômico da cidade. Notadamente na década de 1930 ela influenciou diretamente no crescimento do comércio e da agricultura comercial, o que favoreceu o crescimento urbano e fez de Anápolis o maior centro comercial de Goiás.
A importância desta estação é tamanha que o historiador Juscelino Polonial escreveu sua tese de mestrado sobre o tema, o que posteriormente deu origem ao livro "Anápolis nos tempos da Ferrovia". O seu funcionamento foi entre os anos 1930 e 1950, em decorrência da falta de modernização ela não foi mais utilizada.
Em 1976 os trilhos foram retirados e teve início o processo de degradação deste patrimônio. Nos dias de hoje ela está praticamente "esmagada" pelos dois pavimentos do Terminal Urbano do município. Ela está sendo ocupada por órgãos da prefeitura e não se sabe se suas características históricas têm sido preservadas pelas pessoas que trabalham e que buscam atendimento no local.
Fonte: http://www.jornalestadodegoias.com.br/noticias_detalhe.php?id_noticia=1331&&id_editoria=4

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